Estudantes e docentes da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (Ufba), em Salvador, consumiram por meses água contaminada com coliformes fecais sem saber do risco. A situação alarmante foi descoberta ainda no semestre passado, durante uma atividade prática da disciplina Qualidade da Água, quando alunos decidiram testar amostras da água dos bebedouros da instituição.
Os resultados das análises, realizadas no próprio laboratório da universidade (Labdea), apontaram contaminação por Coliformes totais e Escherichia coli nos bebedouros do 4º e 7º andares — evidência clara de presença de fezes humanas ou animais. Ainda assim, as providências por parte da direção da Politécnica só começaram a ser tomadas nesta semana, após intensa cobrança da professora responsável pela disciplina e dos estudantes.
A professora Gemima Santos Arcanjo, que também é vice-coordenadora do Labdea, foi quem solicitou a interdição imediata dos bebedouros ao tomar conhecimento dos resultados. Apesar do alerta, os equipamentos continuaram funcionando normalmente por mais de dois meses. Segundo a docente, a origem da contaminação pode estar relacionada à proximidade dos bebedouros com os banheiros ou a possíveis falhas no reservatório de água.
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“Solicitei o bloqueio imediato e também kits para repetir os testes. Montei o orçamento e me dispus a comprar os materiais com reembolso da universidade, dada a urgência do caso”, relatou Gemima.
Porém, em vez de autorizar o laboratório da própria universidade a repetir os testes, a direção optou por contratar uma empresa externa, processo que atrasou a resposta ao problema. A única medida emergencial adotada nesse período foi a interdição do bebedouro do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, por iniciativa da própria professora.

Alerta público e repercussão interna
A demora nas ações levou Gemima a enviar um e-mail coletivo para a comunidade acadêmica. O objetivo, segundo ela, não era causar alarde, mas garantir que todos soubessem do risco sanitário. Só então, no dia 8 de abril, a direção oficializou a interdição dos bebedouros da Politécnica, recomendando que estudantes e servidores levassem sua própria água.
A Reitoria e a Direção da Escola Politécnica emitiram uma nota conjunta afirmando que testes de qualidade da água são realizados periodicamente e que providências para limpeza dos reservatórios estavam sendo tomadas. No entanto, a comunidade acadêmica questiona a efetividade dessas medidas e a transparência da gestão diante de um problema de saúde pública.
Conflito entre professora e direção
A situação ganhou contornos ainda mais tensos após a professora afirmar que teve o microfone cortado durante uma audiência aberta, promovida para debater o tema. O Diretório Acadêmico de Engenharia Sanitária e Ambiental classificou o episódio como “um insulto à ciência e à democracia”.
“Silenciar uma professora que denuncia riscos à saúde é, no mínimo, preocupante. O compromisso institucional deveria ser com a transparência e o bem-estar coletivo”, declarou o diretório estudantil em nota.
Água clara, riscos invisíveis
Apesar da contaminação, a aparência da água era normal. Para a estudante Amanda Bastos, esse é um dos fatores que contribuiu para o consumo contínuo: “Ninguém suspeitava de nada. Foi a divulgação feita pela professora que revelou o problema”.
Agora, os bebedouros estão isolados com sacos plásticos, impedindo o uso. Estudantes precisam levar água de casa ou comprar, enquanto o clima de desconfiança e cobrança se intensifica.
O que diz a ciência?
O engenheiro e mestre em Saneamento Jonatas Sodré explicou que a presença de Escherichia coli na água é um sinal crítico. Mesmo em pequenas quantidades, essas bactérias indicam contaminação fecal e podem causar doenças como diarreia, vômito e infecções intestinais graves.
“Água potável não pode conter nenhum índice de coliformes fecais. A limpeza dos reservatórios deve ocorrer, no mínimo, a cada seis meses”, reforçou.
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