Por trás da figura de Kaio da Silva Honorato, conhecido como “Kaioba”, havia um nome temido entre criminosos e moradores da zona norte do Rio de Janeiro. Ex-miliciano e apontado como uma das principais lideranças do Comando Vermelho (CV) naquela região, ele foi morto durante um intenso confronto no Morro do Fubá — área estratégica disputada palmo a palmo pelas facções Comando Vermelho e Terceiro Comando Puro (TCP).
A localidade fica entre os bairros de Cascadura e Campinho e há anos é cenário de confrontos armados, mas nos últimos dias a violência escalou de maneira alarmante. A morte de Kaioba marca mais um capítulo sangrento dessa guerra territorial que há mais de dois anos assusta moradores e desafia as forças de segurança.
De ex-miliciano a “artilheiro” do tráfico
Kaioba não era um criminoso qualquer. Com histórico de envolvimento com milícias, ele acabou migrando para o CV, onde ganhou status de “puxador de bonde” — gíria usada no crime organizado para designar quem lidera invasões a comunidades rivais. Além disso, ele integrava a chamada “Equipe Caos”, um grupo interno da facção responsável por ações violentas e ousadas.
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Nas redes sociais, Kaioba cultivava a imagem de poder: publicava vídeos ostentando armamentos pesados, drogas e exibia fotos ao lado de outros criminosos armados, num claro sinal de provocação às autoridades e aos rivais.
Guerra entre facções acirra tensão no Fubá
No domingo anterior à sua morte (8 de junho), a tensão já havia aumentado nas comunidades vizinhas, com tiroteios prolongados e relatos de moradores ilhados dentro de casa. Kaioba era um dos articuladores da tentativa do CV de retomar o controle do Morro do Fubá, hoje sob domínio do TCP.
Segundo investigações da Polícia Civil e relatos de moradores, a ofensiva vinha sendo coordenada a partir do Morro da Barão, com apoio do Complexo 18, na Água Santa — ambos sob influência do Comando Vermelho. O plano era retomar à força o território perdido.
Do outro lado, o Terceiro Comando Puro contava com o reforço do “Bonde do Coelhão” e do Complexo da Serrinha, em Madureira. As tropas rivais concentravam forças na região da Iguaíba, mantendo o domínio do Fubá sob constante vigilância.
Violência estratégica: o tráfico como empresa de guerra
A morte de Kaioba, executado com tiros de fuzil na cabeça, evidencia o nível de organização e brutalidade dessa guerra silenciosa, onde cada metro de terreno vale ouro. As facções criminosas não brigam apenas por ruas — brigam por rotas de tráfico, por poder sobre comunidades inteiras e pela exploração econômica dessas áreas.
É nesse contexto que surgem relatos de extorsões: comerciantes obrigados a pagar “pedágio”, mototaxistas cobrados por circular em determinadas áreas, e uma população refém da lógica do medo. O caso de Kaioba ajuda a expor como as estruturas do crime estão cada vez mais parecidas com operações militares, com comandos, hierarquias, armamento pesado e controle territorial rígido.
O que esperar daqui pra frente?
Mesmo com a morte de um líder importante, a guerra está longe do fim. Em geral, a queda de um chefe leva a novos conflitos internos ou à ascensão de figuras ainda mais violentas. Para especialistas em segurança pública, a solução definitiva passa por políticas integradas: inteligência policial, atuação social nas comunidades e investimentos de longo prazo em educação, saúde e emprego — pilares que o crime organizado tenta ocupar onde o Estado se ausenta.
Enquanto isso, moradores do Morro do Fubá e adjacências vivem à mercê de um conflito armado que transforma ruas em campos de batalha, com o medo constante como companhia.
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