Uma história que mistura fé, poder e preconceito está chamando a atenção dentro da Igreja Católica. A freira brasileira Aline Pereira Ghammachi, de 41 anos, natural de Macapá (AP), foi afastada do cargo de madre-abadessa do Mosteiro San Giacomo di Veglia, na Itália, após denúncias anônimas que apontavam maus-tratos e desvio de recursos. Ela nega todas as acusações e afirma estar sendo vítima de perseguição e preconceito — inclusive por sua aparência física.
A irmã Aline foi removida da liderança do mosteiro em 21 de abril de 2024, mesma data da morte do papa Francisco. Coincidência ou não, a decisão deixou um rastro de polêmica que envolve questões administrativas, denúncias internas e até comentários considerados machistas e discriminatórios vindos de líderes religiosos.
freira brasileira Aline pereira: “Bonita demais para ser freira”
Em entrevista ao portal G1, a freira relatou que ouviu do próprio frei Mauro Giuseppe Lepori, chefe da ordem à qual o mosteiro pertence, que ela era “bonita demais para ser freira” e que, por ser mulher, brasileira e bonita, ninguém no Vaticano acreditaria nela.
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“Isso me feriu profundamente. Não esperava esse tipo de julgamento dentro da própria Igreja”, declarou a religiosa.
A fala levanta um debate necessário dentro da própria estrutura eclesiástica: há espaço para mulheres líderes e independentes em cargos de poder dentro da Igreja Católica? E até que ponto o preconceito de gênero e nacionalidade pode influenciar decisões internas?
Denúncias e defesa
As denúncias contra a irmã Aline chegaram ainda em 2023 ao papa Francisco e envolviam acusações de abuso de poder, maus-tratos e desvio de dinheiro. No entanto, segundo ela, a parte financeira foi rapidamente esclarecida por meio de auditoria oficial realizada pela diocese, que comprovou a legalidade das contas durante seus cinco anos de gestão.
Ela conta que recorreu da decisão de afastamento no Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, que é a instância judicial mais alta do Vaticano. Até o momento, ela continua morando na Itália, aguardando uma resposta da Justiça eclesiástica.
Impacto no mosteiro
A saída da freira brasileira gerou instabilidade dentro da própria comunidade religiosa. Nos dias seguintes ao seu afastamento, cinco freiras denunciaram à polícia italiana violência psicológica por parte da nova gestora do mosteiro. Ao todo, 11 religiosas deixaram o local desde que a brasileira foi afastada, o que levanta ainda mais dúvidas sobre a legitimidade e os reais motivos da mudança.
Uma vida de fé e serviço social
A história vocacional de Aline Ghammachi começou cedo. Desde os 15 anos, já sentia o chamado religioso, mas sua família pediu que ela concluísse os estudos primeiro. Depois de se formar em administração de empresas, ela decidiu seguir sua vocação e se mudou para a Itália.
Em 2018, aos 34 anos, se tornou a madre-abadessa mais jovem da Itália. Durante sua gestão, o mosteiro passou por grandes transformações: criou projetos sociais voltados para mulheres vítimas de violência, deu acolhimento a pessoas com autismo e implantou uma horta comunitária com produção de uvas, abrindo o espaço monástico para a comunidade local.
Um caso que ecoa além dos muros da Igreja
A história de irmã Aline não é apenas um caso isolado de conflito interno em um mosteiro. Ela escancara problemas estruturais na Igreja Católica, como a falta de representatividade feminina em cargos de liderança, a susceptibilidade a julgamentos baseados em aparência e o conservadorismo que ainda marca muitas decisões.
Enquanto a investigação e o julgamento no Vaticano seguem em sigilo, a freira brasileira diz que vai continuar lutando por justiça:
“Eu só quero a verdade. Estou tranquila porque sei o que fiz, e nada foi fora da lei. Minha consciência está limpa”.
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