A dor de uma perda inesperada e brutal abala não só a família, mas também a comunidade que convive com a natureza selvagem do Pantanal. A morte do caseiro Jorge Avalo, de 62 anos, trouxe à tona um dos episódios mais tristes e raros da convivência entre humanos e animais: um ataque fatal de uma onça-pintada, considerado um dos felinos mais temidos das Américas.
A Polícia Militar Ambiental de Mato Grosso do Sul confirmou que os restos mortais de “Seu Jorge” foram encontrados a cerca de 280 metros do rancho onde ele trabalhava. As marcas no corpo deixaram claro que o ataque foi feito por um animal de grande porte, e todas as evidências apontam para uma onça-pintada.
Agora, a pergunta que não quer calar é: por que isso aconteceu?
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As quatro hipóteses em análise
A PMA trabalha com quatro possíveis explicações para o ataque, e nenhuma delas é tratada com descaso. A intenção é entender o comportamento do animal e evitar que tragédias como essa se repitam. Veja as linhas de investigação:
- Falta de alimento na região:
A escassez de presas naturais pode ter levado a onça a se aproximar de áreas humanas, em busca de sobrevivência. - Comportamento defensivo:
É possível que o animal tenha se sentido ameaçado de alguma forma e reagido instintivamente. - Período reprodutivo:
Durante a fase de reprodução, machos podem se tornar mais agressivos, disputando território e fêmeas. Esse comportamento, comum na natureza, pode ter contribuído para o ataque. - Ação involuntária da vítima:
A hipótese é que Jorge carregava mel nas mãos enquanto caminhava por uma passarela próxima ao rio. Esse cheiro poderia ter despertado o interesse ou confundido o animal.
A polícia também levantou que havia um sistema de câmeras de segurança na propriedade, mas os equipamentos não estavam funcionando no momento do ataque, o que dificultou ainda mais a investigação.
A prática da ceva e seus riscos
Um ponto delicado apurado pelas autoridades envolve a prática da “ceva” – quando alimentos são oferecidos a animais silvestres com a intenção de atraí-los. Embora pareça inofensiva, essa prática é perigosa e proibida por lei.
Além de desequilibrar o comportamento natural dos animais, a ceva aumenta a chance de encontros perigosos com humanos. A onça, por exemplo, pode passar a associar a presença de pessoas à oferta de alimento, o que torna esse tipo de aproximação ainda mais arriscado.
A PMA reforça que legislações importantes proíbem a ceva, como:
- Lei Federal nº 9.605/1998, que trata de crimes ambientais;
- Lei Estadual nº 5.673/2021, que protege a fauna de Mato Grosso do Sul;
- Resolução nº 08/2015 da Semad, que regulamenta a proteção à fauna em nível municipal.
Como tudo aconteceu
No início, o caso era tratado como desaparecimento. Familiares e colegas de Jorge notaram o sumiço e encontraram marcas de sangue nas proximidades da pousada onde ele trabalhava, localizada a cerca de 300 km de Campo Grande, no coração do Pantanal.
As buscas ganharam força após relatos de testemunhas e pistas deixadas na trilha. Partes do corpo de Jorge foram localizadas em uma área de mata fechada, por volta das 5h da manhã do dia 21 de abril, feriado de Tiradentes. Uma imagem de circuito interno, capturada por volta das 6h52, mostrou apenas manchas de sangue e a presença de urubus no local.
Moradores que conhecem bem a região identificaram o “modus operandi” do ataque: a onça teria se escondido na vegetação à beira do rio, aguardando o momento exato para atacar. Essa estratégia é comum entre os grandes felinos que vivem no bioma pantaneiro.
Uma convivência delicada entre homem e natureza
O Rio Miranda, cenário desse trágico episódio, é um dos pontos turísticos mais procurados por pescadores e aventureiros. Mas também é um território de rica fauna, especialmente em épocas de cheia, quando animais silvestres se aproximam mais das áreas ocupadas por humanos.
Essa proximidade exige atenção redobrada. A convivência entre homem e natureza precisa de equilíbrio, respeito e informação. A tragédia que tirou a vida de Jorge Avalo serve como alerta sobre os perigos de interferir no comportamento da fauna selvagem – mesmo que sem intenção.
A polícia continua investigando e, mais do que encontrar culpados, busca compreender. Compreender o que levou a esse ataque, para proteger outros que, como Jorge, vivem lado a lado com o Pantanal.
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